023 Aos pés das virgens.

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Aos pés das virgens.


Post partum, Virgo, inviolata permansisti. Dei genitrix, intercede pro nobis.

Donata a grinalda virginal, o corpo estendidos braços como quem repousa em paz nos benefícios da oração, jaz Donata Santa em redoma de vidro e, particularmente ela, receberá a visita de Gertrudes hoje porque Vina, entregue ao sono reparador de sabeDeus qual trelosa aventura, não pretenderá outra escapada tão breve, presume a Ama por retorno da Menina nesta madrugada sem se preocupar em ser silenciosa: como sempre não dará satisfação de onde foi e nem pergunto mais cuidando de minhas coisas com o esmero de sempre que para isto fui contratada não por amor. E basta! Nem preciso me conte, da minha parte sei, sem ver. E pronto!
Da soleira do palacete à esquerda ruma Gertrudes direto a Santa Cecília rever suas virgens Cecília orago, Luzia Inês Adelaide Catarina coadjuvantes virtudes fazem-lhe companhia, branco mármore olhos aos céus voltados em prece, para sempre, parece.
De trem, diz Damastor no fluir do memorial em noite fria de junho vim de trem do interior: Aqui cheguei no alvor do século, sem saber, no mesmo dia em que Donata virgem mártir dos romanos pagãos chegaram seus santos ossos em relíquia oferecidos aos fiéis para veneração. Num vapor. Ela veio num vapor de Roma, doada pelo Santo Santo Padre Pio e no amparo do Arcebispo aconchegada em caixote, aqui chegaram em desarrumo vértebras costelas fêmures, e o que mais da ossatura pares e singulares compunham o arcabouço necessário para a envergadura à espera da cera ligá-los como se carne fosse. A caveira incluso, creio, veio também, faltos caninos e incisivos embora. Com a pompa religiosa de então fora feito traslado do Palácio Episcopal ao santuário das virgens, no qual São José, o Casto, ocupa honroso altar lateral destituído entanto de ser orago junto a Cecília, como no Império fora; apenas de vésperas Gertrudes soubera do traslado feito há décadas, narrativa de Damastor Belmonte em serão recheado de memórias. Autênticas, o quanto permite o tempo passado há tanto.
Os ossos na cera plasmada em forma perfeita do corpo, andor de vidro, festivo féretro, ao traslado, quem assistiu jamais esqueceu, Damastor Belmonte esqueceria jamais o dia em que conheceu Jacintho batido de vento o cabelo em gomafix e sólida amizade erigida: a grandiosa procissão na lentidão do andar do povo praticante e devoto com lágrimas contrictas e no andor com entrelaçados lyrios e amaranthos Santa Cecília veio anfitriã buscar sua nova virgem, Santa Donata em Caixão Aberto solenemente carregada nos ombros fiéis para a derradeira morada, a cera feito branca neve não derrete no entardecer e nem do céu caiu a chuva por milagre sequer garoa, dele apenas a beleza das pétalas das desfeitas rosas em lenta queda sobre a multidão emocionada. Ao longe o Filho do Prefeito em companhia da Filha do Conde, de famílias cerealistas a ele por Jacintho apresentadas.
Vai Gertrudes hoje para especial busca em Donata Santa: quando em plasta cera modelado teria o artista dado trato de refazer os relevos de minuciosa anatomia, pergunta ela às mãos de luvas desnudas, ou apenas recobriria o esqueleto de tecidos panos é dúvida sussurrada ao chapéu da aba curta, reservaria a plastia aos contornos da face expressividade das mãos, os pés dentro de sapatilhas bordadas, vai Gertrudes pensando com suas vestes simples na roupa melhor de Vina no armário recolhida, ela agora recolhida Julieta no armário, exposta Gertrudes mal vestida pelas ruas.
Naquele dia do traslado começara Damastor Belmonte a firmar riqueza, milagre da santa testemunha no relato do serão arriçado de inverno, perto de sua orada fez morada reputa agradecido, neste bairro simples dos menos abastados; e lá esconder Vina dos olhos cúpidos rebate Gertrudes em pensamentos, mal sabe ele quem de quem esconde as peraltices, que hoje sei.
Joanna dos Anjos entre suas arrudas não duvidava selados nos escritos superiores a encarnação de Malvina dar-se no exato dia da procissão e neste dia estar Damastor na Capital pela vez primeira reunirem-se seus destinos de cuidar Damastor da Menina como um pai cuidoso de uma filha, ele mesmo guiado pelas Elevadas Luzes conheceu os homens bem postos nos altos escalões sociais, filhos de condes e netos de barões duques da cidade, e Jacintho, novos caminhos para quem conhecia estreitas veredas quisesse mais e não sabia existentes; Raphael e Olga mais científicos tinham certeza das almas de Damastor e Vina terem encontro marcado nesta vida, porém desta mesma vida o percurso traçar-se na capacidade deles frente ao meio adverso lutarem para a redenção dos desvirtuados feitos do passado; novas oportunidades em virtuosas ações, os condes duques e barões se ajudaram Damastor Belmonte o esforço foi dele, de mais ninguém!
Gertrudes pensa, com os calos rendimentos do sofrimento, ser a vida melhor gozada pelos astutos que dela tiram proveito, tortos sejam os caminhos firam os pedregulhos a sola dos pés as poças pocilgas respinguem ao acaso, tomem os viventes o atalho queiram tomar, a vida faz ela mesma roteiro a bel prazer transviada em trívios quadrívios torturas esburacadas abismos repentinos, os espertos aprendem e saem-se bem: eu por melhor aluna seja de nascença virgem até morrer.
Divergem as doutas respostas quanto à reencarnação; se tanto há; havendo, dizem uns, dá-se imediatamente durante o ato fecundante, outros afirmam instalar-se o espírito escolhido no soltar-se o primeiro choro, entra oportunista pela dor do violento ar violar pulmões a claridade ferir os olhos. Assim quando pela vez primeira veio Damastor à Capital, era Vina recém-nada portanto, se tanto.
Tímido pára num moquiço, próximo aluga-se quarto visto em papelão inscrito e, do Bom Retiro hóspede fica, vez primeira e última. Outras vindas e tive melhores albergues em requintada vizinhança, até construir casa própria aqui em Santa Cecília, por louvor à Santa sossegado bairro e uso prático de não ser perto mas não ser longe do que preciso aqui. Ofereceram as francesas lolas para seu corpo gigante a fragilidade aloirada do amor venéreo, recusadas por medo de a syphilis encurtar-lhe a vida que se prometia larga comprida afortunada. Não contou da recusa, sequer a oferta citou, mas entre chávenas de chá no arrepio da noite nada mais escondeu:
Maravilhou-o a majestosa Cidade desde na Ferroviária ter apeado seus pouco viajados pés. A Luz frescor de inaugurada, beladama inglesa na forma e os regulares tijolos, acomoda sua elegantina arquitetura no vizinho jardim botânico, luz brilho intenso a refletir-se no nome de batismo, embora da Luz fosse o convento secular ao lado, no resfolego da locomotiva o céu tinge-se com a fumaça das fornalhas pela chaminé soprada obediente aos apitos de partida, turbilhão de faíscas arranco demorado, e vai! a macchina atrelados vagões de volta a unir as cidades e as serras, planícies e planaltos, plantios e virgem mata.
Maravilhou-o a ronquidão do motor dos muitos carros na explosão da gasolina e as buzinas, variados altura e timbres, a jogar para a lateral das ruas as bestas atreladas às viaturas, nunca tantas e tão apressadas gentes indiferentes a quem indiferente por elas passam viu as temerosas gentes nas calçadas espremidas por um Fiat ou um Daimler potentes a virar numa esquina dezenas de cavalos, inusitada força filha do século a raiar. Monsieur Dumont conductor com enormes vidros a proteger-lhe óculos, noutro as mãos enluvadas na direção o Filho do Prefeito sporthista, cônjuge da Filha do Conde que paris conhece e reverencia. Ou conductores fossem os abonados filhos famílias dos donos das Indústrias nascentes na república adolescente. É a civilização, disse-lhe Jacintho quando apresentados percorriam a pé o Trianon de cercas altas, a cidade veremos ao longe daqui de cima do Espigão: céu e terra proclamam a modernidade: no céu o emaranhado dos fios carregados com o conforto da electricidade domada, o telephone redutor de léguas aproxima vozes no arrulhar amante no vocíferar desafeto, o telegrapho tictacqueia a rússia na manhã de frescas notícias, a radiophonia faz do jazz o bailar universal de nossos pés, o phonographo aprisiona o som que antes desordenado ao vento agora é simphonia a desgustar-se repousado nas salas não de concerto mas no prosaico lar: no subsolo gazes e fezes escorrem por esconsos canos, o progresso conduzido em ordem como positivos encaramos agigantar-se o mundo.
Maravilhou-o a procissão. O andor caixão balouça e nele os ossos de Donata Santa, entre o orfeão de desencontradas vozes uma irreverência desviara a atenção de Damastor para um senhor vestido no rigor da elegância: se o Matte Real é saboroso o Bromil cura tosse, que remédios trará esta Milagrosa ao corpo roto dos aflitos. A um dado mal o certeiro produto. No mister em que a Igreja em passos de gigante Milenar pratica: um santo para cada anseio clamam cruzes tangem sinos pelos ares; o Comércio engatinha: nos bondes circula nas paredes ostenta nos tetos impressos anúncios prometem curas da indústria advindas; no caminho certo ela vai, entanto é parca a eficiência ainda. Muito prazer, Jacintho seu criado.

A banda ataca:
Viva o Papa
Deus o proteja
O Pastor da SantIgreja.

O Palácio Episcopal arde-se em luminárias, bandeiras ao vento, fitas verdes entre laçadas amarelas e a banda no repique das caixas, trombones contrapõem fagotes, estridentes clarins atacam surdos a bumbar, sob o pálio paramentado o Arcebispo protege ao peito o ostensório envolto em xailemanta, os Marianos vestem azul as filhas de Maria branco virginal, os velhos dos sagrados corações de Jesus cercado de espinhos da Virgem trespassado por espada ambos a sangrar caminham decididos a morrer por Vosso amor; e o povo a uma voz fiel repetia

Viva o Papa
Deus o proteja
O Pastor da SantIgreja.

a cruzada infantil de meias trêsquartos o cabelo ao meio repartido dispostos a lutar contra o Infiel, em fila vela acesa humilde cortejo afiança estar o divino entre nós.
O Filho do Prefeito exímio porte phísico, sporthista na roupa descontraído colete polainas brancas gravata plastrão de braço conjugado com a Filha do Conde, mangas bufantes beija o chão discreta saia a rodar a sombrinha colorida seda no céu, enxuga uma lágrima emotiva discrição de elegância ela, que paris a conhece reverente, curva-se à singeleza da Santa pelo Papa doada.
Em lentipassos pela São Luiz ruela nova seguem Santa Donata em adamascado caixão desordenados, mas cordeiros, os mais simples de mãos estendidas buscam tocar as fitas que do andor pendependem; ciosos do melhoramento da vida nesta vida e, se não! ao menos, ganharem paraíso no eterno colo paterno, quando levados forem pela beatrix virgem martirizada em Roma hóspede nossa, anseio do povo carregado de temor, o temor! não o amor transforma homens em crentes, diz Jacintho sem cavo na voz.
Os fogos, chispas e fumaças odor de pólvora ardentes velas, estrondos e uníssonos cantos, o caixão contorna a Praça da República, refeita adornada com lagunas pontes jardim sem grades como queria o Prefeito Prado afim a usasse o povo por coisa pública, e desce pelo Arouche largo e rua, ruelas transpostas praça à vista o campanário clama alvíssaras, as Virgens da Igreja abrem o átrio desdobradas portas à santa novata: duas dezenas de anos depois entra Gertrudes, contrariada por não poder andar de passeio pelo Triângulo vestida de Julieta, consolada de entre as virgens proclamar-se mártir também da voluntariedade de Malvina, sua má-menina.
Dezenas passadas Santa Donata, o olho de vidro desorbita contra a pálida cera que premida cede, num canto à esquerda de soslaio vígil, anônima entre as cinco virgens majestades em branco mármore esculpidas
Ignês Luzia Adelaide Catarina
cercas gentis
invioladas damas
de honra
pareiam Cecília.
Música em simphonia poliphonicos jograis recitadas odes ritmados passos, Cecília ao centro reina-mor no altar principal.
Nas paredes à volta, feito tapeçaria mas em óleo sobre tela, pinturas contam história de martírios: o casamento que não se consuma no degradado ato carnal recebendo do ArcAnjo entrelaçados lírios e amaranthos. O marido, pagão convertido, propõe-se casto como casto se resignara Sanctus Joseph permanecer por mais estonteante fosse a beleza da virgem.
Esculpido bronze da cor do damasco adelgaça o sangrento da narrativa.
Consentido martírio. Ao chão jaz Cecília, a degola interrompida pela mão trêmula do verdugo em repentina piedade, sangra três dias abandonada na masmorra, os dedos unidos indicador médio e anular testemunham a trindade divina, crença cristã entre desalmados pagãos de muitos deuses.
Gertrudes ajoelha-se mas não reza.
O chão coalhado de vermelho vivo a circundar o bronze esverdeado: só poderia ter sido assim se, por três dias, fabricasse aquele corpo tanta vida quanto a luta contra a morte requeria. Dar o sangue. Diziam os colonos da Borboleta, ao limparem o suor da testa escorrido e novamente orvalhado por entre pó da terra e carvão da fumiflamante queimada de abril outonal a tórrido dezembro para a cana, o podão em punho. Derrubar a mata até então inviolada não importa qual mês registre a folhinha, a cinza aduba garantem os mais velhos que no solo virgem faz-se o carvão forragem para o plantio, revirar a terra lançar a semente enquanto aguarda capinar: o algodão promete próspera safra e o café de sete anos de espera cercado de fogo contra a fria geada de certeiro ataque. Damastor vem buscar para benefício a colheita bruta. Do porto de Santos, o mercado estrangeiro é mar singrado a vapor.
No dia em que Damastor veio, milho para pamonha leite para manjar é festa quando Damastor vem, a rês abatida para churrasco, ninguém sabia que no corpo protegido um feto na placenta umbilicado vingava lento. Soubesse alguém, calara-se. Gertrudes vira, a novilha núbil pelo touro montada, se contasse descobririam o que no pasto fazia escondida entre touças.
Cafre! disse Abadiah, os rasgados olhos fechados em horror. Não quero ver! a boca de grandes risadas.
Gertrudes viu. Vida, peso que mata. Sobre o corpo da novilha o touro jogara-se bruto destemperado. O martelo agora desce forte sobre a nuca, a rês desaba. Rápido o cutelo rompe as veias do pescoço, a rês por muito tempo resiste de morrer, na poça as patas mexem-se em vão, o corpo treme, coágulos. Aberto o ventre, para um lado o intestino pleno de verdes, para o outro o feto arremedo das formas que jamais terá; o corpo rosa transparente, olhos fechados globos azuis, o coração mudo.
A pão e água, masmorra! sem som a boca déspota sela o destino do plebeu. Encantados, os olhos projetados na tela coalhada de luz em viva narrativa, o povo do lugar ri e chora conforme no nada drama e comédia em contraponto mentem verdades; Gertrudes, atenta a quantas direções pudessem olhos e ouvidos alcançar, viu e ouviu de Damastor achegar-se com a proposta indecorosa a resposta honrosa de Abadiah que, enquanto mulher de Alberto, contudo, não será de outro homem seu corpo intacto.
Acreditei, então, ser a recusa oferta de fruto proibido, à dificultosa colheita mais apetitoso se pronuncia. Ela calcula para Alberto morte em breve, essa minha crença!
Nunca entendeu Gertrudes com tal clareza por que se recusaria Abadiah a alguém como Damastor, homem da phísica sporthista, jovem belo promissor. Quando o sexo se aquece, não há quem seja feio ou aborrecido lampejados todos por um amor passageiro feito a própria chama, seguida das cinzas do arrependimento. Não se prometera virgem nem para os céus em pressupostas leis ou dos homens quisesse as pretendidas condutas seguir, sequer se reservasse como eu por horror não me entregue enojada embora carregado o corpo de desejo, por feia ou desajeitada nunca seria recusada que era mulher de airoso andar das perfeitas pernas a passear formoso rosto, nos seus rastros profunda admiração e respeito carreava: foi devota do amor. Contudo.
Na época julgara que, à recusa, na intimidade seguisse total entrega ao despudor: enganei-me em minhas malícias. Inteirei-me dos pormenores mais condizentes aos fatos no leito de morte de Abadiah, a quem ouvi como se confessa alguém na hora extrema. Alberto era o motivo, contudo!; e não me arrependi sussurrou ela entre os estertores. Eu, que duvidei, aqui de joelhos me arrependo.
Não era capaz de magicar Abadiah tão contida quem a visse, respostas curtas entre risos cortadas, olhar de brilho rápido boca úmida de ter a presa sempre à espreita para as saciedades impossíveis, os desenvoltos gestos os passos firmes, ir e vir a notável Abadiah, presença requisitada, ausência lamentada. O fogo rege seus atos, como entender a contenção em meio a tantas labaredas.
Contudo Abadia, corpo e alma a Alberto pertencentes.
Porta aberta entram, homens e mulheres fiéis solitários apartados na mesma solidão, cada um à sua maneira órfãos da cidade, buscam acostamento no manto da misericórdia, lento andar desenham a cruz no corpo encolhidos entre as subidas colunas gigantes, uma noutra solidárias testemunhas vermelhas da fé abafam nas alturas os passos e qualquer ruído, houvesse algum, como se oração fosse o suspiro o soluço o gemido os sussurros sem som os lábios em mudo movimento reproduzem a prece em clausura no peito em desalento. As cordoalhas do coração agigantam-se no interior infinito do átrio e, se antes para tão pequeno cavo imensa dor, amansa-se o fervilhar inquieto da vida na certeza de ser curto o sofrimento quanto curta a mesma vida frente ao eterno repouso, promessa contida nos santos a contemplar dos grandes altares a pequenez humana.
Nunca acreditei no amor de Abadiah por Alberto, eu que nunca acreditei no amor. Era para acreditar, voz corrente do povo nunca ter visto feição de desvelo abnegado quanto em Abadiah no dia-a-dia presente. Nada a ver com amor, penso sem conseguir refutar-me, parente próximo do interesse ou parecer orgulhoso de reconhecimento público de estremada bondade. Abadiah, jamais vi em sua boca articularem-se os lábios, conquanto aos olhos sempre quentes, para falar amor fora da frieza de sons convenientes a uma narrativa, palavra presa entre outras num relato bebido pelos ouvintes como maná de uma deusa advindo. Se fala Damastor, amor, é vocábulo sublinhado em cavo profundo, distinto em cores vivas traços firmes. Quando falava Alberto, ainda sadio a bela voz pelo quintal ecoada, a quentura do amor e o hálito saiam do mesmo peito. Também neles nunca acreditei, os homens, culpa deles o mal do mundo sejam os cabeças na pátria sejam reis do lar, o mando não os abandona do berço ao túmulo em proteção disfarçado.
Mas Abadiah cuidou fiel de Alberto, caído em doença desde as bodas comemoradas por todo arraial e, com melhoras festejadas como cura e recaídas tidas como desengano médico, ela reconhecida viúva para novamente ser mulher dele até a seguinte piora. Pelo povo apreensivo das pioras as festejadas melhoras: de Abadiah porém, confesso minhas santas, sempre duvidei por onde as festas e os sobressaltos andariam, se entre melhoras se entre pioras. Contudo Damastor não conseguiu dela aquilo que um homem quer de uma mulher, nem que tenha de casar.
Damastor, quanto Abadiah, bem-vindo o falecimento conductor de novos festejos de casamento. Damastor dizia saber esperar, não teria feito fortuna sem confiança no tempo passando trazer consigo novas realizações, basta não dormir no aguardo de que do céu caiam benesses. Confirmado por Jacintho: pessoas há que convertem os minutos em diminutivo acreditando com isso compactar os ponteiros do relógio; outros colocam o tempo no superlativo, com isso magicam dilatar seu decorrer. Eu dou ao tempo a nobreza de minhas ações. Eu também, completa Damastor.
Tanto que conheceu, na alta sociedade, mulher de fino aparato parcas prendas domésticas mas que paris conhece de photos e colunas sociais presente na moda seu bom gosto para modernidades, uma das primeiras a abandonar as anquinhas e dar às saias centímetros a menos ao calcanhar, maneiras comedidas e sereno riso na propriedade das situações, Damastor seguro de ter a fortuna acrescida e não os beijos de Abadiah o que na vida almejava dando ao tempo seus devidos passos, aconselha-se com Jacintho quanto a casar-se:
Um casamento será melhor afortunado quanto maior as posses das famílias unidas; se não puder como eu permanecer solteiro e bem servido, eu diria que uma mulher sempre ajuda.
Desinteressada de Donata, desgosta-a a pose de morta a fragilidade da cera a corromper-se qual carne aos vermes dada, Gertrudes mantém-se de joelhos junto ao bronze de Cecília como quem reza.
Sou mulher séria e prática, quem magica quem devaneia, imagina pensativa supõe e acredita, cisma e teima quimeriza e sonha, não é comigo tais perdas de tempo: eu só tenho certezas, só acredito no que vejo, e pronto!


Arquivo 023 de Conto Romances
Paulino Tarraf
Versão de 07/12/2007

Versões anteriores
05/112/007
Original de 19/06/2007

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